CLAUDIA PUCCI
VÁ (OU ASSIM FALOU BEATRICE)
então feche os olhos.
vá ficando assim, meio sorrindo. livre a roupa que aperta.
vá ficando assim, meio livre
tire o suor do sacrifício. não, nada sacro. balance o sacro, ao invés.
vire de pernas pra cima,
vá ficando assim, meio vermelha.
vá ficando assim, meio vapor na cabeça, meio carne viva.
latejante.
vá ficando assim, mulher sem vergonha.
vá ficando assim, vida sem medo.
LINGER (OR THUS SPOKE BEATRICE)
so, close your eyes.
linger on, half smiling. free the binding clothing.
linger on, half free
take the sweat from sacrifice. no, nothing sacred. shake the sacrum, instead.
flip legs up,
linger on, half red.
linger on, half hotheaded, half in the flesh.
tingling.
linger on, naughty woman.
linger on, fearless life.
O CANTO DO TEMPLO DAQUELAS QUE RIEM
Há um templo.
Há um trono.
Nesse trono, sentadas em pérola,
precioso grão-fonte de puro prazer,
somos.
Nesse ser, geradas em festa,
encobertas por véus da floresta dos sonhos,
emergimos.
Frente ao mar, num coro oscilante
pulsando nas palmas da pura alegria,
dançamos,
cantamos,
subimos
E bebemos os fluidos de lua na noite estrelada dos ternos delírios,
acendemos fogueira de cura na terra sulcada de tensos abismos,
ofertamos, no topo da torre, o gosto da vida banhada de rios
e lambemos o gosto orvalhado da pele lustrada de gozos e risos.
THE SONG OF THE TEMPLE OF THE LAUGHING ONES
There is a temple.
There is a throne.
On this throne, sitting on pearls,
precious grain-source of pure pleasure,
we are.
In this being, conceived in joy,
covered by veils of the dream forest,
we emerge.
By the seashore, in oscillating choir
pulsing on palms of pure delight,
we dance,
we sing,
we rise
And drink the fluids of the moon in the starry night of tender deliria,
we light the fire of healing on the plowed soil of tender abysses,
we offer, atop the tower, the taste of life bathed in rivers
and we lick the dewy taste of the skin anointed with laughter and glee
O JULGAMENTO
Confesso.
Confesso sentir o amor como uma flor escancarada no peito. Confesso medo quase insuportável de queimar nesse calor. Nessa ida até onde nem sei, confesso.
Eu confesso, mas não me orgulho.
Confesso não ter seguido meu pulso.
Confesso ter desdenhado a dor de tantas outras, confesso ter tentado fugir, confesso ter nascido no fluxo, confesso ter memória pequena, confesso ter deixado de ouvir o canto, confesso ter me resignado às migalhas do pouco desse tempo, confesso ter cortado os pulsos e deixado esvair meu ser inutilmente, confesso ter destilado veneno por pura inveja de quem nada teme, confesso ter submetido o meu pranto ao martírio de causas levianas, confesso ter julgado as tantas outras formas de vida,
confesso ter me perdido da vida. Confesso ter me deixado na sombra.
Confesso ter congelado um sorriso cordial e covarde, confesso a dor da memória de um tempo que eu tenho o medo do acesso, confesso a dor desmedida de quem não esconde ferida exposta, confesso ter incendiado a minha casa antiga e velha e mofada, confesso ter me atirado na longa jornada sem pão e sem rumo,
confesso soberba danada de quem não confia na ajuda dos homens,
confesso soluço jogado a esmo sem ter uma voz que acalante,
confesso a procura de um tempo onde o ser volta à tona parindo sorrisos,
confesso o peso das coisas que hei de largar mas ainda carrego,
confesso a esperança de ter vislumbrado a saída num longo caminho,
confesso a fé que se escora nos olhos vendados e mãos estendidas,
confesso difícil a entrega pra quem foi julgada, traída e perdida,
confesso uma chance presente de rever história com olhos crianças,
confesso desejo de ser plenamente o que sonho com ar de lembrança,
confesso desejo de dar nova chance a essa vida que é nova e que chama.
Confesso que não quero mais confessar.
Pelos lados, quero só respirar.
Conspirar.
Ligar traços,
desenhar constelações.
THE JUDGMENT
I confess,
I confess I feel love as a pry-open flower on the chest. I confess an almost insurmountable fear of burning in this heat. This trip towards I-don’t-know-where. I confess.
I confess, but I am not proud.
I confess I did not follow my pulse.
I confess having disdained the pain of so many others, I confess trying to run, I confess being born on the flux, I confess having short memory, I confess having stopped to hear the singing, I confess my resignation to the crumbs of this time’s shortness, I confess having cut my wrists and allowed my being to uselessly fade, I confess having distilled venom envious of the fearless, I confess having submitted my tears to the martyrdom of vain causes, I confess having judged so many other forms of life,
I confess having lost life. I confess abandoning myself by the shade.
I confess having frozen a cordial and coward grin, I confess the pain of the memory of a time when I am afraid of accessing, I confess the unmeasured pain of the who does not hide an open wound, I confess having burned down my run down, old and moldy home, I confess having thrown myself to the long haul without bread and route.
I confess the damned arrogance of not trusting men’s help,
I confess the abandoned hiccup without having a voice to cradle it,
I confess the search for a time when being comes back birthing smiles,
I confess the weight of things I shall abandon but I still carry,
I confess the hope of seeing a way out on a long path,
I confess the faith lingering on veiled eyes and stretched open hands,
I confess the hard deliverance for the judged, betrayed and lost,
I confess the present chance of reviewing history with children’s eyes,
I confess the desire of being wholly what I dream with hints of nostalgia,
I confess the desire of giving a new chance to this new alluring life,
I confess I do not want to confess anymore.
Sideways, I just want to inspire.
Conspire.
Connect the dots,
draw constellations.